segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Reflexões acerca de Pesquisa em Ciência da Informação

Este post tem como objetivo inicial o atendimento a tarefa solicitada na disciplina de Pesquisa em Ciência da Informação, e, como demais objetivos, de explorar esta área trazendo discussões, reflexões e  indicações de elementos importantes. Considero que o seu maior propósito, como consequência de todo este processo, será contribuir com meu amadurecimento na trajetória de pesquisador aprendiz.

O livro “O Olhar no Espelho” de Eduardo Augusto Tomanik (2004) faz a base conceitual para os recortes parafraseados e registrados nos parágrafos a seguir.  Estes recortes foram selecionados baseando-se na minha percepção de importância entre todos os elementos que foram estudados.

Quatro razões porque não devemos considerar a ciência como um agrupamento estático  de teorias ou leis: (1) a ciência é uma forma de conhecimento da realidade, sendo esta não estática; (2) o próprio avanço da ciência contribui para o aparecimento de novos campos e forma de pesquisa; (3) com  frequência aparecem conhecimentos científicos que não são aceitos dentro da própria comunidade científica; (4) critérios de definição do conhecimento científico são válidos num determinado período da história e em outro não.

A ciência divide a realidade em áreas de estudo e frequentemente estas se tornam tão complexas que ainda são ainda subdivididas, ou ainda são agrupadas para gerar outra ciência. Neste contexto é importante não confundir fenômenos com objetos de estudo das ciências, pois o primeiro  pode ser objeto de estudo de várias ciências e cada uma delas adota um método apropriado para estuda-lo.  Sendo assim o objeto de cada ciência é “o que” ela se propõe a conhecer, e os métodos indicam “como” ela se propõe fazer. O conhecimento de diferentes métodos é indispensável pois nos ajuda a elaborar melhores descrições e a desenvolver afirmações mais fidedignas às situações pesquisadas.

Entre as dificuldades para se fazer ciência estão: (1) grande tempo para formação de um cientista; (2) excesso de burocracia; (3) deve ser uma tarefa coletiva; (4) apesar da importância da criatividade, há muito mais necessidade de trabalho árduo. O esforço do cientista inicia bem antes da realização da pesquisa e, de uma maneira geral, ele deve ter um alto grau de resistência a frustação. Estas dificuldades são, na verdade, desafios e acabam tornando a ciência fascinante. 

A metodologia, o estudo dos métodos,  é uma área de ciência que tem como objetivo discutir os requisitos necessários para que uma afirmação seja aceita como válida pela própria ciência.  Existem  impressões equivocadas a respeito de metodologia que são contrapostas com as seguintes recomendações: (1) ela vai muito além das normas ou formas de apresentação de um trabalho científico; (2)  metodologia não é um conjunto de regras fixas, pois, em alguns casos, pode demandar um novo método adequado ao objeto de estudo; (3) ciência não deve uma atividade obscura com aparência hermética que alguns cientistas o fazem de forma proposital; (4) a ciência não deve ser uma atividade puramente acadêmica, mas também deve fazer parte das empresas, industrias etc.; (5) a ciência não deve ter domínio total da natureza, pois o homem não tem total controle sobre os fenômenos físicos, sociais e humanos; (6) a ciência não é portadora de verdades absolutas, mas provisórias, pois uma das coisas que a caracteriza é a dúvida e não a certeza; (7) a ciência não é politicamente neutra, pois como ela é um conjunto de ações humanas capaz de influenciar a estrutura social então é também uma atividade política. 

Uma das características fundamentais da ciência é a discussão, isto é, se a ciência pretende ser um conhecimento válido sobre a realidade a discussão é uma exigência e uma das funções dos cientistas é a de discutir critérios que permitam estabelecer os limites e alcances dela que, normalmente, sofrem alterações ao longo da história. A própria falta de definição exata e/ou única de ciência é um reflexo disto.

A visão empiricista de ciência afirma que o que é possível conhecer são exclusivamente os fenômenos e suas relações, não a sua essência. É o estudo das leis naturais que regem os fatos. Essa visão tem origens no positivismo. Diferentemente de empirismo, o empiricismo vai muito além de um mero conjunto de experiências individuais, não intencionadas e não coordenadas.  Ao contrário do idealismo predominante em tempos remotos e que exigia dos estudiosos um espírito contemplativo e uma grande capacidade de distanciamento das coisas materiais como forma de atingir a verdade divina, o empiricismo exige do pesquisador uma mente crítica, objetiva e racional, ou seja, o que vale  não é o que o cientista imagina ou pensa, mas aquilo que realmente é, através de atividades racionais dirigidas ao sistemático conhecimento com objetivo limitado e capaz de ser submetido à verificação.

A principal crítica ao empiricismo é que a ciência não é neutra e, portanto, não é capaz de produzir um conhecimento “universal” e “natural” alheio às questões de poder e participação social. Isto porque quem produz ciência são os cientistas que não são pessoas alheias ao mundo social mas dependentes dele e está sujeito às mesmas pressões econômicas que os outros profissionais, e como ser social também está sujeito às ideias e tendências de seu tempo e de seu grupo. Se  a subjetividade do ser humano é eliminada também será eliminada a possibilidade de que ele venha a transformar e a recriar sua realidade, além disto o ser humano não se relaciona com as coisas tal como elas são, mas tal como ele as considera.

Existem critérios que tendem a garantir a qualidade dos conhecimentos elaborados: (a) coerência: ausência de contradição, argumentação estruturada e dedução lógica das conclusões; (b) consistência: capacidade de resistir a argumentações contrárias e a atualidade da argumentação; (c) originalidade: uma produção não tautológica, ou seja, não meramente repetitiva, representando real contribuição ao conhecimento; (d) objetivação: tentativa de reproduzir a realidade como ela é, mais do que como gostaríamos que fosse; (e) intersubjetividade: é a vigência do argumento em ciência, a ingerência da opinião dominante dos cientistas de determinada época e lugar na demarcação científica, por exemplo, o mesmo enunciado dito pelo professor e pelo aluno não tem a mesma validade em si.

Um dos problemas cruciais para a prática da ciência é a linguagem, enquanto no cotidiano ela é bastante “elástica”, onde um conceito pode ter vários significados dependendo do contexto, na ciência ela deveria ser precisa e sem apresentar ambiguidades.  Por outro lado, na linguagem popular grande parte dos conceitos é proveniente de experiências particulares e, portanto, são carregados de significados pessoais, avaliativos, conotações positivas ou negativas e acabam agregando juízo de valor.  A ciência deve muito mais tentar tornar claro o que é conceito e o que pode ser juízo do que trabalhar para a eliminação dos juízos. Neste contexto, existem situações complexas de serem resolvidas: (1) o uso na ciência de termos que não possuem correspondente na linguagem para iniciantes; (2) o uso de termos com significados diferentes na ciência e na linguagem comum; (3) a apropriação, por parte da ciência, de termos de uso comum, mas atribuindo-lhe outro significado.

Afinal de contas, a ciência deve usar clareza ou sofisticação? Não há razão para que a ciência use termos sofisticados  ou frases de construção complexa que tonam a compreensão mais difícil. Existe o mito de que o estilo obscuro é  profundo e o estilo claro é superficial. Duas questões servem como balizadoras e elementos de reflexão para quem irá redigir um texto científico: (1) para quem se escreve? Isto é, quem é o leitor que se pretende atingir?  (2) para que se escreve? Isto é, o que se pretende atingir com o texto?  De uma maneira geral, é bom escrever para alguém que não domine o assunto, pois se o texto for claro nestas condições, então certamente será para leitores com conhecimentos avançados.

O planejamento de uma pesquisa é parte fundamental do processo de obtenção de conhecimento, pois dependem das decisões do pesquisador. Um bom planejamento é aquele que acontece ao longo de todo o processo: no estudo e no aprofundamento de reflexões sobre teorias existentes, na escolha cuidadosa dos problemas, no preparo minucioso das ações e no tratamento competente dos dados. 

Pode-se organizar a escrita de um projeto em duas grandes partes: (I) a que responde “o que?” composta de tema, a fundamentação teórica, o problema da pesquisa e as hipóteses; (II) a que responde “como?” composta dos procedimentos e métodos. Cada um dos elementos que compõe estas partes possuem indicações elementares: (1) tema: deve ser importante, original, viável e , se possível, pertencer a um assunto que interessa o pesquisador; além disto, deve-se também ter razões claras para a escolha deste tema; (2) fundamentação teórica: basicamente deve-se ler, depois pensar sobre o assunto e, por último, organizar os conhecimentos assim obtidos, ou seja, aprofundar conhecimentos, tomar conhecimento das várias posições existentes levantando pontos de concordância/discordância e confrontando-as entre si e determinando consequências de cada uma delas, e ainda serve para selecionar melhor e com mais precisão o problema a ser pesquisada; (3) problema da pesquisa: é a pergunta específica que se pretende responder com a pesquisa; precisa ser expresso de forma clara com limites bem estabelecidos; apesar de não ser amplo como a definição do tema, o problema também deve satisfazer os critérios de originalidade, importância e viabilidade; (4)  hipóteses: são respostas prováveis e provisórias do problema da pesquisa; mas, se o assunto a ser pesquisado é novo com pouco ou nenhum dado disponível e de uma realidade pouco conhecida, então não há como elaborar hipóteses, além disto, hipóteses sem fundamentos podem atrapalhar deixando o trabalho amarrado; de uma maneira geral as hipóteses servem para delimitar ainda mais o problema a partir da fundamentação teórica que se elaborou, pois é mais fácil verifica-la do que investigar todas as respostas possíveis do problema; (5) procedimentos e métodos: envolve a população ou campo da pesquisa, a metodologia, o cronograma e o orçamento; sendo que a parte da metodologia pode envolver a aplicação de vários métodos pois estes não são unidades estanques ou isoladas, e além disto, eles requerem técnicas que por sua vez requerem instrumentos, todos escolhidos conforme situação de pesquisa.

Como a atividade científica é realizada dentro de um contexto social e também é influenciada e até determinada por este contexto, não é possível que ela seja politicamente neutra. Muitas vezes o mito da neutralidade é incentivado pelos detentores do poder econômico, cientistas ou não, conscientes ou não, para a confirmação de um sistema social baseado em desigualdades de poderes e direitos.  Desta forma, existem dois polos: os que querem a manutenção do sistema vigente de desigualdades e os que querem a superação deste sistema. Em função desta dicotomia, e na direção daqueles que querem a mudanças no sistema vigente, pesquisadores procuram métodos diferenciados onde haja participação dos pesquisados no processo, tal como a pesquisa participante.

Na pesquisa participante a metodologia e o investigador são somente um elemento, e também a metodologia é inseparável dos grupos sociais com os quais o investigador trabalha. Além disto, ela se caracteriza pela existência de três objetivos: (i) existe produção de novos conhecimentos dentro da realidade pesquisada; (ii) estes conhecimentos devem ser transferidos para a população envolvida com intuito de modificá-la através de num processo pedagógico que lhes permita compreender melhor sua situação; (iii) ocorre a elaboração e execução de propostas de ação coletiva, com base nas análises realizadas.   A pesquisa participante sintoniza-se com a ideia de que “a realidade é sempre mais complexa do que podemos perceber; por isso pesquisamos. Ela é sempre diferente do que gostaríamos que fosse; por isso tentamos modifica-la”.  Desta forma, este tipo de pesquisa gera dúvidas, situações de conflito, novas investigações, novas buscas e descobertas e, consequentemente, novas pesquisas participantes.

O efeito da ideologia na ciência também vale para a pesquisa participante, isto significa que além dela produzir desejáveis efeitos transformadores, ela também pode produzir efeitos conservadores e até reacionários. Isto é inerente às ideologias de seus executores. Outro problema associado a pesquisa participante é que ela não se adapta à estrutura curricular da maioria das universidades. Outro alerta é que este tipo de pesquisa não pode ser visto como a única maneira válida para a realização de uma ciência a favor das camadas sociais menos favorecidas e contraria a situações de dominação e exploração.

De uma maneira geral, não se pode atribuir a um método a crença absoluta sobre a sua eficácia ou sobre a sua ineficácia. Isto pode acarretar na não construção de instrumentos que se adequem de forma mais precisa à realidade estudada. Desta forma, os princípios da dúvida sistemática e da reavaliação constante são algumas das principais contribuições que a ciência pode oferecer à sociedade que a produziu.

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